"Tentar reter talentos é mesma coisa que tentar enxugar gelo"
Recentemente, li em uma revista que o tempo médio que um profissional no Brasil permanece em uma empresa atualmente é de 5 anos. O mesmo texto diz que nos EUA é inferior, de 4 anos. Além de me fazer pensar, isso me remete à primeira experiência profissional, numa multinacional com mais de 100 anos no Brasil e que mantinha a tradição de oferecer, na época, um relógio de ouro para os funcionários com 25 anos de casa. Nos anos em que trabalhei lá, vi pelo menos umas 5 pessoas ganharem este simbólico prêmio pela fidelidade e anos de dedicação à empresa. Ali aprendi bastante, conheci pessoas incríveis e me desenvolvi muito como executivo. Mas nunca, nunca mesmo, passou pela minha cabeça (nem em sonho) que um dia eu ganharia o relógio de ouro. As pessoas da minha geração que conheci lá e que começaram a carreira na mesma época pensavam o mesmo. Muitas até, de forma desrespeitosa, zombavam e tiravam onda com o tal do relógio. Eu, ao contrário, achava a ideia legal e confesso que me emocionei ao ver algumas pessoas comemorando o prêmio. No momento, pensava que esse período de 25 anos era mais do que uma vida. A maioria dos casamentos não dura nem a metade disso. Logo, para alguém dedicar 25 anos da sua vida a uma empresa, de duas uma: Ou essa pessoa não tem opção melhor do que fazer na vida (coisa que não acredito), ou aquela empresa tem um conjunto de atributos muito bons para que alguém fique ali por tanto tempo. Esta empresa, especificamente, tinha uma gestão de RH bastante profissional. Um modelo de análise de resultados e de desenvolvimento de competências que nunca mais vi nas minhas futuras organizações. Quando se identificava um talento, entrava em cena um modelo de retenção bastante interessante, que envolvia novos projetos, transferências de áreas e unidades, expatriações, aumentos de salários, cursos, afagos e mimos (faltava só o cafuné!). Um arsenal poderoso, inteligente e bastante eficaz, ao ponto de segurar por muito tempo algumas pessoas brilhantes que lá conheci.
Mas, mesmo com essa artilharia pesada, dos 23 trainees que entraram na minha turma, menos de 5 estavam na empresa 5 anos depois. Eu, por exemplo, saí ao completar 5 anos. Foi difícil sair dali. Eu sentia que em breve algo bem interessante estava para acontecer comigo. O meu sonho de trabalhar fora do Brasil estava bem próximo. Eu não tinha grandes queixas. O meu salário era bom e as perspectivas, melhores ainda. Mas um projeto novo me seduziu. Um setor novo, um start up (início de uma nova empresa). A ideia no novo venceu. Por mais que me apelidassem de louco (dentro da empresa e, principalmente, na minha família), eu fui. Começar do zero, com pessoas novas, produtos novos, clientes novos. Tudo novo. Até a cidade, porque tive que mudar de estado.
Ao ler aquela matéria, pouco antes de sentar e escrever este artigo, conclui que não acredito mais em nenhuma estratégia que tenha como objetivo a retenção de talentos. Não tem jeito: cedo ou tarde o líquido escapará entre os dedos. Aposto que se fosse feita uma pesquisa com os melhores profissionais do mercado, quase a totalidade responderia que não pensa em continuar em seus atuais empregos por muito tempo. Ouço isso continuamente dos meus melhores alunos e ex-alunos. Faça a empresa o que fizer, estas pessoas acima da média não vão ficar. Um dia, mais cedo ou mais tarde, vão sair em busca de novos desafios e novas experiências. Esta é a nova regra, para desespero da galera de RH e dos líderes que querem equipes fortes. Não há mais fidelidade às empresas (por sinal, não há mais fidelidade à quase nada, talvez só ao time de futebol!). A coisa hoje gira em torno do “Enquanto for legal” e “Se aparecer algo melhor, eu vou”. E esta não é uma questão meramente empresarial. Trata-se de uma questão social. Os relacionamentos estão mais curtos. Ponto. As novas gerações e, sobretudo, as pessoas mais competentes e empreendedoras, não são e não serão sensíveis a programas de retenção, usem o que eles usarem. Elas sempre vão querer algo mais, que nem sempre passa por dinheiro, benefícios ou cursos. Há um componente intangível que nenhum programa de retenção conseguirá suprir.
Só resta então, se esta visão tiver um mínimo de lógica, aceitar que neste século as relações serão mais curtas entre empresas e pessoas. Às empresas e líderes que queiram ter, mesmo que por pouco tempo, pessoas acima da média em suas equipes, faço a mesma recomendação que defendi nos 3 últimos artigos sobre atração de talentos: Ambientes autênticos, Projetos para desafiarem continuamente estas pessoas e, por fim, uma forte cultura de meritocracia. Quem fizer isso terá mais talentos e por mais tempo. Mas nunca pra sempre. Por sinal, pra sempre não existe mesmo, a não ser nos contos de fadas.