Sou fã da Revista Você S/A. Sempre acompanhei de perto suas publicações e tive a honra de participar da matéria de capa de março de 2016, onde a minha pesquisa foi alvo de uma bela matéria. A Você S/A é pioneira nas discussões sobre carreira, sucesso profissional e desenvolvimento de competências. Tem uma equipe muito bem preparada e está sempre em busca de recortes relevantes e profundos sobre o tema. Faz um trabalho fantástico.
Na sua última edição, nos trouxe uma capa que me chamou a atenção. O título é “O mito da meritocracia”. Quando li isso quase caí da cadeira e fui correndo ver o que tinha ali, até porque sou um defensor brutal do termo “meritocracia”, falo dele em praticamente todas as minhas aulas e escrevo muito sobre isso. A frase que mais sai da minha boca (quem já foi meu aluno sabe) é “No médio e no longo prazo o mundo é meritocrático e vai premiar sempre os melhores”.
Pois bem, nesta matéria, a Você S/A usa uma metáfora muito legal para discutir a meritocracia. Compara-se a carreira a uma corrida, na qual, o vencedor ganharia uma nota de 100 dólares. Antes da largada o juiz faz algumas considerações. “Dê dois passos à frente se você teve acesso à educação privada. Dê dois passos à frente se você nunca teve que ajudar seu pai e sua mãe com as contas”. E segue com outras benesses, mostrando que alguns começam a corrida praticamente na linha de chegada. Por fim, traz o texto: “Isso é a representação das desigualdades que faz com que muitos, independente de seus esforços pessoais, demorem mais tempo para atingir um objetivo... Por isso precisamos discutir o conceito de meritocracia”.
Concordo em gênero, número e grau, e adorei a metáfora que mostra que estamos muito, muito longe, de uma igualdade de oportunidades. Tem sim muita gente que larga, na corrida chamada carreira, metros à frente de outros. Por vários motivos, mas principalmente porque não conseguimos, como nação, gerar oportunidades para todos. Mas isso não tem absolutamente nada a ver com o conceito de meritocracia. Aqui acho que misturou-se conceitos.
Vamos ao dicionário? Lá, está claramente o conceito de meritocracia: o termo Meritocracia — do latim mereo ('ser digno, merecer') e do grego antigo κράτος, ('força, poder') — estabelece uma ligação direta entre mérito e poder. Um modelo meritocrático é um princípio ou ideal de organização social que busca promover os indivíduos — nos diferentes espaços sociais: escola, universidade, instituições civis ou militares, trabalho, iniciativa privada, poder público, etc — em função de seus méritos (aptidão, trabalho, esforços, competências, inteligência, virtude). Isso é tão verdade que existem muitas pessoas que, mesmo largando atrás e com muitas diversidades conseguem vencer. Verdade ou não?
Resumindo: meritocracia é a promoção por mérito e nada mais do que isso. Na sua definição, não existe nada em relação às oportunidades. Isso é outra coisa. Colocar a questão de oportunidade aqui é, na minha visão, um equívoco que não ajuda a promover este conceito que deveria ser ensinado desde a educação básica. “No longo prazo, o mundo vai sempre premiar os melhores e os mais preparados”. É óbvio, e não nego, que tem gente que larga na frente e isso deve ser combatido em uma sociedade que quer ser mais justa, mas oportunidade é uma coisa e meritocracia é outra. Meritocracia não é mito, é fato.
Quem me conhece sabe da minha compulsão no uso da nossa língua e nos significados das palavras. Portanto, acho que o título da capa deveria ser outro, como, por exemplo: “O desafio tornar a competição mais justa”. Até o próximo!